Cultura

O Clube dos Spartacus

A abolição dos escravos de Mossoró, ao contrário do que muitos pensam, não foi um ato político e sim social. Não foi algo surgido através de decreto, imposição, mas uma manifestação popular, um grande trabalho comunitário surgido no seio da Loja Maçônica 24 de junho, e aceito pelo povo de Mossoró.

No dia 06 de janeiro de 1883, num dia de sábado, era instalada, na “Casa das Sessões da Câmara Municipal”, que naquele tempo funcionava no edifício da Cadeia Pública, hoje Museu Municipal, a “Sociedade Libertadora Mossoroense”, entidade que tinha como objetivo extinguir do solo mossoroense, “a mancha negra da escravidão”. Apesar de ter surgido sob auspícios da Maçonaria, a Sociedade Libertadora Mossoroense não era uma entidade apenas maçônica. Congregava também “profanos” favoráveis à libertação dos escravos. Tinham um código e uma data como meta para alcançar o objetivo. O Código da Liberdade, como ficou conhecido, tinha um único artigo sem parágrafo que determinava: “Todos os meios são lícitos a fim de que Mossoró liberte os seus escravos”. E a data era 30 de setembro.

Nove meses incompletos era o tempo que a Sociedade Libertadora Mossoroense dispunha para alcançar o objetivo. Muito havia por ser feito. No dia 10 de junho de 1883, numa sessão especial realizada na Loja Maçônica “24 de junho”, eram alforriados 40 escravos, dos 86 registrados na Coletoria Estadual, resultado do trabalho conjunto de todas as forças abolicionistas de Mossoró. Finalmente em 30 de setembro daquele mesmo ano, o objetivo era alcançado. Todos os escravos de Mossoró haviam sido libertos. O fato foi registrado em ata pelo grande abolicionista Almino Afonso, que assim registrou: “Para o humanitário fim de declarar livre e emancipada esta bela porção de terra americana, onde já não pode medrar a planta exótica da escravidão, que envenenara por tanto tempo nossos valados e serranias, esterilizando e exaurindo a vitalidade e a abnegação do patriotismo riograndense”.

Com o feito de 30 de setembro, Mossoró passou a ser a “Meca” da liberdade, para onde corriam os escravos fugidos de outros municípios. Por esses, pouco ou nada podia ser feito. A lei garantia aos senhores de escravos, a devolução dos seus fujões. Com relação a esse fato, alguma coisa precisava ser feita: e foi feita.

Por inspiração de Almino Afonso, foi criado o “Clube dos Spartacus”, que tinha por objetivo dar abrigo e amparo aos escravos que aqui chegavam por mar ou por terra. Era a continuação da “Libertadora Mossoroense”, a tropa de assalto dos abolicionistas. Esse clube tinha como presidente um ex-escravo, o Sr. Rafael Mossoroense da Glória e como secretário seu antigo dono, Alexandre Soares do Couto. Quando os cativos fugiam à procura de guarida em Mossoró, o Clube dos Spartacus os escondia, evitando que os seus donos ou os Capitães-de- Mato, que a esse tempo exploravam profissionalmente a captura de negros fugidos, os encontrassem. Em seguida embarcavam-nos para Fortaleza, libertando-os.

A inspiração para a criação do clube, Almino Afonso foi buscar na história de Roma antiga. Spartacus era um escravo guerreiro, que foi líder de uma revolta de gladiadores e escravos contra o poder do Império Romano, por volta do ano de 73 a. C. A figura de Spartacus sintetiza os conceitos da luta social: os oprimidos enfrentando juntos o seu opressor. O escravo que lidera uma rebelião contra a toda poderosa Roma, o centro do mundo. Seus feitos serviram como sustentação ideológica para diversos movimentos sociais que se auto proclamaram revolucionários e libertários.

Esse era o objetivo do Clube dos Spartacus. Um clube de ex-escravos libertando escravos. Uma tropa de choque não oficial, arriscando a recém adquirida liberdade e a vida para que outros tivessem liberdade.

Geraldo Maia – colunista

“É Notícia Mossoró”

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