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Por que a Rússia está em guerra contra a Ucrânia? Entenda mais sobre o conflito

Fatos históricos muitas vezes parecem distante da realidade na qual vivemos cotidianamente, e quando começam a acontecer dentro da nossa realidade a ficha demora um pouco a cair. Foi assim que aconteceram grandes eventos históricos dentro de seus respectivos contextos. Posso usar como grande exemplo aqui o Brasil: Seja quando nos tornamos uma República em 1889 ou até mesmo quando nos tornamos “Independentes” de Portugal em 1822. Foram fatos históricos de grande relevância, mas que sabemos que a sociedade da época demorou – e muito – para assimilar tudo aquilo que estava acontecendo. Foi assim na Era das Guerras e será assim quando o mundo estiver novamente vivendo algo catastrófico ou não dentro de sua história.

Thomas Hobbes já observava que “a guerra consiste não só na batalha, ou no ato de lutar; mas num período de tempo em que a vontade de disputar pela batalha é suficientemente conhecida” (O Leviatã, cap. 13)

O historiador Eric Hobsbamw se baseia no conceito chamado de “A era da guerra total” para poder tecer sua ideia sobre os conflitos que assolaram o mundo no século passado. E um desses conflitos é o que conhecemos por Guerra Fria, iniciado com o fim da 2ª Guerra que se estendeu até o final do século XX.

Primeiro devemos voltar um pouco na história especificamente para os séculos XIX e XX para entender a ligação que a Ucrânia tem com os russos. Com a saída do Império Russo da 1ª Guerra Mundial (1914 – 1918) em 1917 para tratar da Revolução que acontecia em seu território, houve no ano seguinte a guerra Polaco-Soviética (1918 – 1919) que chegou ao seu fim com o acordo de Paz de Riga que dividiu o território ucraniano em dois. Um pedaço ficou com os poloneses e outro se tornou a República Socialista Soviética Ucraniana que foi anexada em 1922 a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), no qual pertenceu ao bloco até o ano de 1991.

Na década de 1930, promovido pelo governo de Stálin e seu desejo de industrializar o país, a coletivização das terras acabou gerando muitos conflitos na Ucrânia. Com várias baixas no país, esse contexto acabou acarretando aos ucranianos uma grande escassez de alimentos, período esse que ficou conhecido como Holodomor (morto de fome). Porém, precisamos compreender que o conceito estabelecido – Holodomor – não se trata de um planejamento por parte do governo soviético para uma necropolítica* assim como existiu por parte de Hitler no seu governo fascista para com os judeus e outros povos. Há sim um processo de coletivização de terras de forma violenta por parte do governo soviético, mas como dito, não de forma planejada. Na década de 1950, o primeiro-ministro soviético Nikita Khrushchov atendeu o pedido ucraniano para a anexação do território da Criméia que pertencia desde o séc. XVIII aos russos.

Com a independência da Ucrânia a partir do fim da URSS em 1991, os ucranianos e a União Europeia tentaram fazer um acordo que não chegou a se efetivar após desistência dos ucranianos, o que levou em 2013 a uma série de manifestações que ficou conhecido como Euromaidan que buscou uma maior aproximação entre a Ucrânia e a Europa Ocidental. É claro que devemos olhar com muita cautela toda a influência oriental e ocidental dentro desses países até então. Todo esse processo levou a Revolução Ucraniana (2014) com a queda do presidente Viktor Yanukovytch que era aliado dos russos. Putin não reconhece o governo provisório da Ucrânia e decide por invadir a península da Criméia em 2014. A Criméia é um território estratégico para os russos, inclusive em Sebastopol se encontra a base naval russa no Mar Negro, a tomada e anexação da Criméia pelos russos foi ratificada em 2015 e gerou a expulsão da Rússia do G8, uma série de sanções e o não reconhecimento dos ucranianos. No mesmo ano, foi assinado o Protocolo de Minsk (2014) (cessar fogo) entre os países que estavam em conflito na região de Donbass. União Europeia e EUA veem a Ucrânia como aliado estratégico, e a OTAN prometeu alianças em 2008 com a Ucrânia e Geórgia, o que acabou com a invasão russa na Geórgia. Além do setor de energia ser chave para entender o conflito com o Nord Stream 1 e 2, gasoduto criado pela estatal russa Gazprom, é um potencial chave para aumentar o poderio russo e enfraquecimento da economia de outros países, levando em consideração que 43% do gás natural que abastasse a Europa é fornecido pelos russos.

As questões entre ocidente e oriente continuam com seus desdobramentos até a atualidade. O governo ucraniano continua com um grande desejo pela aproximação com o ocidente, além de desejar entrar para a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), o que faria com que a Ucrânia se afastasse ainda mais das tratativas com o governo russo. É necessário levar em consideração que alguns países que faziam parte do bloco soviético como Estônia, Letônia e Lituânia fazem parte da OTAN, que começou sua expansão de forma mais veemente nos anos 2000. Visando combater essa expansão e fortalecer sua economia, os russos participaram da criação do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Também temos o reconhecimento da independência das regiões de Donetsk e Lugansk por Putin esse ano (2022). O que gerou ainda mais animosidade entre russos e ucranianos. A narrativa do governo russo para invasão tem muitas faces que vai da aproximação da OTAN – entende-se por EUA – até a ideia de desnazificar a Ucrânia.

É claro que os conflitos que hoje vemos se desenrolar através desses dois países é uma questão muito profunda que acontece no decorrer de vários séculos como citado no artigo, e que em um mundo globalizado como o nosso terá consequências tanto no mundo ocidental como oriental. Precisamos é compreender que tudo isso faz parte de uma guerra híbrida, muito além do conceito de guerra tradicional que costumamos utilizar para tais fins. É uma guerra de narrativas, cibernética, tecnológica, econômica e cultural, mas claro, sem esquecer de sua forma cruel e tradicional com utilização de poderio bélico. Para quem deseja se aprofundar mais no assunto deixarei algumas referências bibliográficas que utilizei para o artigo.

Referências bibliográficas

Conceito criado pelo filósofo Achille Mbembe, no qual questiona-se se o Estado possui ou não “licença pra matar” em prol de um discurso de ordem (https://www.politize.com.br/necropolitica-o-que-e/)

BERMAN, Marshall. Tudo que é sólido desmancha no ar

HOBBES, Thomas. O Leviatã: Matéria, palavra e poder de um Governo Eclesiástico e Civil

HOBSBAWM, E. A era dos Extremos: O Breve Século XX (1914 – 1991)

_____ . A era dos Impérios (1875 – 1814)
_____. A Era das Revoluções (1789 – 1848)

MBEMBE, Achille: Necropolítica.

Texto Colaborativo

Por: Fernando Henrique – Professor de História

“É Notícia Mossoró”

 

 

 

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