Um andarilho que lutou por Mossoró
Em 11 de março de 1927 chegou a Mossoró o andarilho gaúcho Álvaro da Costa Lopes, procedendo da Bahia, num ‘raid’ pedestre com destino a América do Norte. Encontrou, porém, a cidade agitada. Boatos davam conta de que a cidade seria atacada por um bando de cangaceiros, liderados pelo famigerado Virgolino Ferreira da Silva – o Lampião, e a população preparava a sua defesa.
No dia posterior a sua chegada compareceu a redação do jornal ”O Nordeste”, que era publicado pelo jornalista J. Martins de Vasconcelos, a quem se apresentou, mostrando a documentação dos lugares percorridos. Definia o ‘raid’ como “uma excursão a pé, ao longo de muitos caminhos e muitas surpresas, do Brasil aos Estados Unidos”. O percurso, por ele calculado em 14.250 quilômetros, estava programado para ser coberto em 475 dias, acrescido de mais 125 dias para descanso, o que totalizava 600 dias de viagem a pé, ou seja, um ano e oito meses.
Pela iminência do ataque, resolveu permanecer na cidade, juntando-se aos voluntários que organizavam a defesa, capitaneados pelo Prefeito Rodolfo Fernandes. Apresentou-se às autoridades e depois de devidamente identificado e comprovado a confiança que passou a merecer, foi imediatamente incorporado ao exército de defensores. Tomou parte em todos os preparativos de defesa, e ocupou lugar na trincheira do Telégrafo, de arma na mão. O gesto de Álvaro não passou despercebido. Foi recompensado pelo Prefeito do Município, que reconheceu nele a espontaneidade e o espírito cooperativo. O Sr. Mirabeau Mello, que chefiava a defesa do Telégrafo Nacional, ofereceu ao jovem andarilho uma comenda com dizeres: “Ao raidman Álvaro da Costa Lopes, o Telégrapho Nacional – Mossoró, 13-6-1927 – Homenagem”.
Embriagado pela emoção dos momentos vividos em Mossoró, Álvaro deixou fluir a veia poética de que era dotado. E recolhendo-se ao quarto de hotel onde estava hospedado, passou a descrever em versos a epopéia de que fora testemunha. Foi a sua homenagem a Mossoró pela vitória alcançada sobre o bando de Lampião no ataque de 13 de junho de 1927.
“Amor Omnia Vincit” é o nome do poema por ele composto. Esse poema passou a ser cantado em todo o Nordeste, como uma paródia da “Ave Maria”, a imortal canção de Erothides de Campos. Eis os versos:
Mossoró era um ninho florido
-Paraíso num festim de amores
Onde tudo era sonho e candura
Trescalando o aroma das flores.
Veio um dia o terrível bandido,
O assombro de todo o Nordeste,
Esmagar a calma santa e pura
Deste Éden grácil e celeste.
Jesus, lá do céu, ouvindo os clamores,
Quais hinos febris e cheios de dores,
Enviou a sua bênção piedosa
A esta terra fértil e formosa.
E o bando sinistro, furioso a correr,
Fugiu disperso, covarde e a tremer,
Com medo das balas certeiras
Saídas das nossas trincheiras.
Mossoró, varonil, denodado.
Ó Titã dos combates renhidos!
Celebraste pelo mundo inteiro
O valor dos teus filhos queridos.
E assim venceste o celerado,
Dando exemplo de grande civismo,
Rechaçando o vil bandoleiro,
No mais alto grau de heroísmo.
Acalmados os ânimos e depois de uma temporada de descanso na cidade, Álvaro da Costa resolve retomar a viagem, seguindo o rumo traçado em seus planos. E assim, na manhã de 06 de julho de 1927, partiu de Mossoró a caminho do seu sonho, levando lembranças de uma gente destemida, deixando saudades na terra que ajudou a defender, e que ainda hoje canta os seus feitos.
Geraldo Maia – Colunista
É Notícia Mossoró